Pesquisa personalizada

sábado, 24 de outubro de 2009

Muito Longe de Casa - Ishmael Beah

Infelizmente possuo menos tempo do que eu gostaria para desfrutar dos prazeres da leitura e, sempre que posso, procuro encontrar algum livro que seja bom o suficiente para usufruir os raros momentos de ociosidade. Quando comprei o "Muito Longe de Casa" deixei ele parado por mais ou menos um ano em minha estante antes de poder começar a sua leitura. Bastaram apenas vinte páginas para que eu não conseguisse mais largá-lo, acabei lendo em umas duas semanas e hoje posso compartilhar a minha experiência com você aqui no CulturiFique. O livro conta a histótia real do próprio autor Ishmael Beah que como um garoto normal de sua idade gostava de cantar e dançar rap, ler Shakespeare, brincar e ir para a escola. Infelizmente sua vida se passa em Serra Leoa, África e logo a sua infância como ele conhecia até os treze anos de idade irá mudar drasticamente. Sofrendo com conflitos internos que já duram vários anos, Serra Leoa não oferece muitas chances para jovens como Ishmael que logo é "recrutado" pelo exército e passa, sob o efeito de drogas e vingança, a ser apenas um reflexo do que a guerra pode fazer com as pessoas. No livro Ishmael passa (em meu ver) por umas quatro fases distintas: sua infância com sua família e amigos; a constante tentativa de fugir da guerra onde, com solidão e medo, passa por fome e dúvida; o "alistamento" onde ele se torna apenas mais uma máquina movida por drogas e ódio; e sua díficil recuperação em um centro de reabilitação da Unicef na cidade de Freetown. Um ótimo e poderoso livro que mostra, por alguém que esteve presente, como o bixo homem é complicado e, ao mesmo tempo tão simples.

Ishmael hoje participa de projetos e palestras da Unicef, relatando seus acontecimentos e mostrando que é possível mudar e mudar pra melhor.

Segue uma entrevista que encontrei no site G1 com o próprio Beah um pouco antes de participar da Feira Literária Internacional de Paraty - FLIP - em 2007.

G1 - No seu livro de memórias, você diz que vive em três esferas: o presente, o passado e os sonhos. Como é conciliar esses mundos diferentes? A literatura tem ajudado nisso? Você, que passou a infância numa aldeia, em meio à natureza da África, sente-se adaptado e confortável em Nova York?
Ishmael Beah - O passado, o presente e os sonhos me fizeram ser quem eu sou hoje. Eu aprendi e ainda estou aprendendo a viver com todos os aspectos da minha vida. Hoje, eu uso as experiências de cada capítulo da minha vida como ferramentas úteis para viver bem e em paz. A literatura, ou melhor dizendo, o ato de escrever, tem me ajudado porque me permite entrar em contato com minhas memórias mais difíceis e entendê-las. Isso acabou se tornando uma forma de “cura”, ainda que não tenha sido este meu objetivo ao iniciar minha vida de escritor.


Eu me sinto bem em Nova York porque é um lugar onde é fácil ser anônimo. Mas eu sinto falta da minha casa de infância, onde a proximidade da natureza trazia a simplicidade de viver.

G1 - Você tem viajado por todo o mundo para divulgar sua história. Quais suas expectativas com Paraty e como espera que as pessoas reajam a seu livro?
Beah -
Eu quero que as pessoas saibam de onde eu vim – minha história não apenas durante a guerra, mas também antes e depois. Eu espero que se conscientizem sobre o uso cada vez maior de crianças nas guerras em todo o mundo. E o mais importante é que todos vejam a humanidade naqueles que tiveram uma vida violenta, saibam que são capazes de se recuperar quando recebem ajuda e apoio devidos. Espero que os brasileiros possam se sensibilizar com os apelos de todas as crianças que sofrem em qualquer lugar do mundo.

G1 - No Brasil, há gerações de jovens sendo perdidas, vítimas da violência urbana nas áreas pobres das grandes cidades. Não é uma guerra civil como a que você viveu, mas há semelhanças: há garotos de 12 anos transformados em soldados do tráfico de drogas, portando fuzis. Eles cometem crimes, matam, torturam e são mortos antes de completar 20 anos. O que você pensa deste tipo de “guerra” que ocorre no Terceiro Mundo?
Beah -
De forma alguma podemos permitir que qualquer criança não tenha infância ou tenha uma infância miserável. O que a violência faz ao espírito humano é o mesmo em qualquer lugar. As circunstâncias talvez sejam diferentes, mas o sofrimento é o mesmo. Isso impede que as pessoas conheçam a si próprias, conheçam sua humanidade e vejam o que são capazes de fazer numa vida sem violência.

G1 - Você está gostando da vida de autor? Pretende escrever mais livros? Há novos projetos em andamento?
Beah -
Sim, eu estou curtindo a vida de autor porque eu acredito que o objetivo que me levou a escrever meu livro se realiza quando mais e mais pessoas têm consciência sobre o uso de crianças nas guerras e as possibilidades de sua reabilitação. Eu estou trabalhando em um novo projeto, mas está muito cedo para falar sobre isso. Mas em breve eu voltarei a escrever.

G1 - O que você acha da situação de seu país hoje? Tem alguma esperança de um futuro melhor para os que continuam a viver lá?
Beah -
A situação em meu país é muito difícil porque a corrupção política endêmica continua. Mas eu acredito na força do povo, na sua resistência, no esforço para mudar e na esperança de um futuro melhor. Mas essas coisas não vão acontecer da noite para o dia.

G1 - Você continua gostando de rap? O que está ouvindo agora?
Beah -
Eu não tenho tido tempo para o rap, mas eu ainda amo esta música, especialmente as mais antigas e algumas poucas novas que são mais poéticas. Um dos meus MCs favoritos atualmente é um cantor da Somália chamado K’naan que vive em Toronto. Seu álbum chama-se “The dusty foot philosopher”. Suas músicas trazem o que o verdadeiro hip hop deveria mostrar: poesia, histórias e consciência social que estão em falta no cenário atual.

1 comentários:

Anônimo disse...

adorei a entrevista luana

Postar um comentário